quinta-feira, 28 de abril de 2011

Algo que aconteceu na Semana Santa

Algo que aconteceu na Semana Santa


E de repente, um menino vem e pede um trocado ao honrado cidadão num trailer de lanche.
Aí o honrado cidadão diz ao menino uma meia dúzia de desaforos antes de lhe dar alguns centavos que nem lembrava mais que tinha, achou por coincidência no bolso do short.
O menino escuta tudo, numa tranqüilidade de invejar, aperta a moeda na mão e sai:
- Que seja pra comer ou pra uma bala, pra um cigarro, seja pra um ingresso de parque, que seja pra gozar! Seja só pra mim, pra o que eu quiser! Porque eu não tenho nada! Além de desaforos, e o que vem logo depois deles, é claro... – e aperta a moeda na mão de novo.
- Por menos que seja, não interessa, eu fico parado e espero – um garoto e um estranho – lá na frente, ele abre um sorrisinho cínico, corre pra longe da vista.
No meio da noite, no meio de gente grande, em meio ao trailer, em meio a outros moleques satisfeitos e lambuzados, no meio de mesas de pessoas de respeito – respeito – mas veja lá sabe o que é isso? Isso, é só parte da lei natural das coisas, só se dá o que se tem, só se tem o que se ganha, só se ganha o que se merece, e se o assunto é respeito, entre outras coisas, bem você sabe né? Num sabe?
Faz uns trocados pedindo, depois de muita falação injuriosa, junta o suficiente pra tomar um refrigerante, come um sanduíche, anda num brinquedo no parque, fuma um cigarro – vive todo o luxo dessa vida.
E muito melhor que todo mundo, passeia sob os olhares hostis da gente: já sabemos onde ele vai chegar, ah! Sabemos sim! Antes dele mesmo saber!
Seu destino está selado.
Ser bandido se for forte.
Um marginal se for mediano,
ser um ébrio se for fraco.
Ou morrer cedo.
Então num só coro, todos começam a odiar o futuro, olhando nos olhos de uma criança que já não tem mais nada haver com sóis e nuvens numa folha de papel oficio, com lápis hidrocor, ou, com roubar frutas na vizinhança, e depois esquece-las!
Nesse contexto, colocar as coisas dessa forma fica até ridículo, você não acha?
As vezes,  provocado no instinto mais humano, de tão humano chega a ser meio divino, me pergunto – principalmente agora estando em plena semana santa – será  que Jesus menino, que nasceu e cresceu pobre, que brincou e sorriu, dividiu de nossa natureza, teve um corpo e suas necessidades, dividiu conosco tudo! – exceto, é claro, nossos pecados – não podia ele cessar essa injustiça?!
 Levantar-se como guardador do rebanho, olhar para ali, oh! Ali, oh!
 Limpar a terra dos dedos do garoto, lavar-lhe os pés e os olhos, deixar que se lambuzasse até que matasse a vontade, como fazem as outras crianças!
Afastar-lhe das injurias, fazer com que esqueça do jeito adulto de ver as coisas!
Nada de escrever certo em linhas tortas, simplesmente, descesse da dor da cruz, e combatesse o pecado aqui na terra, com os olhos de uma criança! Que acredita que tudo é possível.
Na perfeita fantasia do mundo, do jeito mais bonito, divertido e justo.
Esquecesse que é juiz de juízos complexos, e agisse como um herói compassivo, calasse o mal-feitor com suas palavras de ordem, jogando-o num profundo silencio, e a escuridão que ele espalhava, se dissipasse completamente. Daí, a criança que ainda mora dentro daquele garoto, pudesse ir, como que, para dentro de um sonho:

Com algo de brisa,
daquelas que traz um cheiro leve de chuva
 – de repente – Ele abra os olhos e possa ver uma maravilha de montanhas,
Sol e nuvens, e queira desenhar numa folha de oficio ali em cima de uma mesa a se alcançar com o braço,
 e não se lembre mais das injurias, ódio, e de tudo que, talvez, ele nem merecesse ter conhecido.
Pra finalizar, me leva nesse sonho também menino Jesus, nesse apelo de justiça, que possa ser eu também uma criança, para corrermos nós três, em grandes campos a brincar – claro que não poderia esquecer meu egoísmo tão próprio e tão natural do pensamento humano – nessas palavras que são,
A minha oração de hoje.